Carina Joana: de acordo com o vento que sopra

Há três anos Carina Joana largou a vida no Rio e foi viver em um veleiro. Ela tinha 32 anos e o Miss Cuca, um barco do tipo Brasília 23 pés, media aproximadamente 7 metros de comprimento, de popa a proa.

“Sou formada em desenho industrial e trabalhava como designer gráfica. O ‘como estava a minha vida naquele momento’ é fundamental para a decisão porque eu estava num hiato, livre para escolher o que eu quisesse”, conta. “Morava sozinha num apartamento próprio, não empregada, estava iniciando um negócio com uma amiga. Eu tinha um apartamento, um barco e um trabalho que podia ser executado pela internet. Com o aluguel do apartamento poderia sustentar a vida super simples que eu teria no barco. Para trabalhar precisaria garantir energia e internet, nada complicado”.

O negócio acabou não vingando, então Carina se viu livre para embarcar no plano de viver além do cais.

“Isso, de ver um veleiro como casa, faz parte de mim desde sempre. Meu primeiro contato com o barco à vela aconteceu na infância, entre meus 4 meses de idade e meus 10 anos, através, primeiro, dos meus pais que já me carregavam a bordo desde bebê e, depois, pelas minhas primeiras aulas de vela, nos famosos optimists que são barcos pequeninos ideais para crianças. Foi assim que eu me habituei com o estar a bordo e adquiri meus primeiros conhecimentos sobre como um veleiro funciona”, conta.

Carina lembra que, na virada para o ano novo de 2015, na hora de fazer um desejo, não soube o que pedir. “Nos dias seguintes refleti sobre o que eu desejava para minha vida e quais eram as minhas possibilidades”, recorda.

“Na minha lista de desejos, aparecia velejar mais e morar num veleiro. Dois meses antes, viajando num veleiro bastante confortável tinha passado pelo meu universo de ideias o quanto era possível fazer de um veleiro uma casa, mas que até aquele momento e ainda naquele momento, não era para mim um plano ou um sonho, estava mais para um pensamento simpático e descomprometido de criança, que dentro de um barco se sente numa casa do seu próprio tamanho”.

Na lista de possibilidades tinha o Miss Cuca. “O meu veleiro que pouco usava, pequenino para quem pensa em casa, mas que parecia a medida exata diante do meu desconhecimento sobre o que estava por vir, era o desafio de crescer junto com o barco”.

Em menos de um mês, no final de janeiro de 2015, Carina já estava pisando no Miss Cuca como sua nova casa, junto com a pug Abigail. “Foram alguns meses em mudança, desmontando a vida em terra e montando a vida no mar ao mesmo tempo”, conta, acrescentando que Abigail realmente gosta de estar no barco.

A primeira parada foi a enseada de Sítio Forte, em Ilha Grande, um dos lugares preferidos de Carina. “Mas tenho vivido por Ilha grande, Paraty, Angra, Mangaratiba, Ilha Bela, Ubatuba”, conta. “Nesse momento estou em Angra, reformando o motor e trabalhando outras coisas do barco”.

Em julho de 2016, Carina e Abigail mudaram para o Criloa, um barco maior, do tipo Impala 35 pés, com aproximadamente 10,5 metros de comprimento, um veleiro clássico construído na Itália no início da década de 70.

Carina conta que no sentido de “uau” a vida a bordo é bastante farta.

“Ainda mais para quem está começando como eu”, diz. “Tem o ‘uau’ do primeiro contato com os vizinhos de mar, tem o ‘uau’ das primeiras melhorias no barco, tem o ‘uau’ do dia que eu e o Miss Cuca nos soltamos do nosso porto e fomos morar ancorados, a primeira tempestade na âncora, a primeira tempestade velejando, a troca de barco, o primeiro mar aberto sozinha, a primeira regata, a primeira tripulação… Cada ‘uau’ faz eu me sentir maior e mais forte, ao mesmo tempo menor e vulnerável, é como se eu crescesse junto com o mundo, só que o mundo sempre cresce mais”, diz.

As dificuldades, claro, também são muitas.

“Dentro da rotina, a maior dificuldade está ligada à resistência, resistir aos dias de mar agitado quando você se sente vivendo dentro de um chocalho, aos dias seguidos de chuva onde podemos experimentar a sensação que tudo está úmido e seguirá assim para todo sempre, aí virão os dias de calor, que serão muito quentes, a dificuldade de quando você tem que ir em terra e por causa de chuva, vento e mar, o caminho entre o barco e a areia da praia parece uma grande aventura”, enumera. “O importante é saber que essas dificuldades sempre estarão na rotina de quem vive a bordo e cada dia que passa nos adaptamos e descobrimos formas diferentes de lidar com elas, até deixar de encarar como dificuldade e sim com naturalidade”.

“O que me deixa em crise são os problemas de manutenção do barco, que as vezes parecem grandes demais para mim, coisas que ainda não conheço bem tecnicamente e que exigem decisões claras. Ou seja, a grande dificuldade estaria comigo em qualquer lugar, o barco desafia claramente a minha insegurança”.

Carina conta que tem vivido e se movimentado de acordo com a interpretação do que a circula, das possibilidades que se apresentam, de acordo com o vento que sopra. “Posso dizer que a vida vem me surpreendendo com situações mais interessantes do que as que eu poderia desejar”, comemora.

Ela diz que não pensa em voltar a morar em terra. “Mas não vejo problema nisso. Acredito, que um dia olharei para terra e, por acaso, verei meu nome num cantinho qualquer, quando isso acontecer, irei, realmente satisfeita”.

 

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Cassiano Viana (@vianacassiano) é editor do About Light.

 

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Veja galeria de fotos de Carina Joana aqui.

 

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